segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Carta ao Apóstolo Paulo

Conta-se que o Apóstolo Paulo enviou seu currículo para a Junta de Missões Mundiais de certa denominação, oferecendo-se para trabalhar como missionário. Depois de algumas semanas, o Secretário da Junta escreveu-lhe esta carta, justificando por que não poderia aceitá-lo.




Ao Reverendo Saulo Paulo

Missionário Independente



Roma, Itália



Caro Sr. Paulo:



Recebemos recentemente seu currículo, exemplares de seus livros e o pedido para ser sustentado pela nossa Junta como missionário na Espanha.

Adotamos a política da franqueza com todos os candidatos. Fizemos uma pesquisa exaustiva no seu caso. Para ser bem claro, estamos surpresos que o senhor tenha conseguido até aqui "passar" como missionário independente.

Soubemos que sofre de uma deficiência visual que, algumas vezes, o incapacita até para escrever. Essa certamente é uma deficiência grande para qualquer pessoa. Nossa Junta requer que o candidato tenha boa visão, ou que possa usar lentes corretoras.

Em Antioquia, o senhor provocou um entrevero com Simão Pedro, um pastor muito estimado na cidade, chegando a repreendê-lo em público. O senhor provocou tantos problemas que foi necessário convocar uma reunião especial da Junta de Apóstolos e Presbíteros em Jerusalém. Não podemos apoiar esse tipo de atitude.

Acha que é adequado para um missionário trabalhar meio-período em uma atividade secular? Soubemos que fabrica tendas para complementar seu sustento. Em sua carta à igreja de Filipos, o senhor admite que aquela é a única igreja que lhe dá algum suporte financeiro. Não entendemos o porquê, já que serviu a tantas igrejas.

É verdade que já esteve preso diversas vezes? Alguns irmãos nos disseram que passou dois anos na cadeia em Cesaréia e que também esteve preso em Roma, e em outros lugares. Não achamos adequado que um missionário da nossa Junta tenha folha corrida na Polícia.

O senhor causou tantos problemas para os artesãos em Éfeso que eles o chamavam de "o homem que virou o mundo de cabeça para baixo". Sensacionalismo é totalmente desnecessário em Missões. Deploramos, também, o vergonhoso episódio de fugir de Damasco escondido em um grande cesto.

Estamos admirados em ver sua falta de atitude conciliatória. Os homens elegantes e que sabem contemporizar não são apedrejados ou arrastados para fora dos portões da cidade, tampouco são atacados por multidões enfurecidas. Alguma vez parou para pensar que palavras mais amenas poderiam ganhar mais ouvintes? Remeto-lhe um exemplar do excelente livro "Como Ganhar os Judeus e Influenciar os Gentios", de Dálio Carnego.

Em uma de suas cartas, o senhor referencia a si mesmo como "Paulo, o velho". As normas de nossa Missão não permitem a contratação de missionários além de certa idade.

Percebemos que é dado a fantasias e visões. Em Trôade, viu "um homem da Macedônia" e em outra ocasião diz que "foi levado até o Terceiro Céu e que ouviu palavras inefáveis". Afirma ainda que viu o Senhor e que ele o confortou. Achamos que a obra de evangelização mundial requer pessoas mais realistas e de mente mais prática.

Em toda a parte por onde andou, o senhor provocou muitos problemas. Em Jerusalém, entrou em conflito com os líderes do seu próprio povo. Se alguém não consegue se relacionar bem com seu próprio povo, como pode querer servir no exterior? Dizem que tem o poder de manipular serpentes. Na ilha de Malta, ao apanhar lenha, uma víbora se enroscou no seu braço, picou-o, mas nada lhe ocorreu. Isso soa muito estranho para nós.

O senhor admite que enquanto esteve preso em Roma, "todos o esqueceram". Os homens bons nunca são esquecidos pelos seus amigos. Três excelentes irmãos, Diótrefes, Demas e Alexandre, o latoeiro, disseram-nos que acharam impossível trabalhar com o senhor e com seus planos mirabolantes.

Soubemos que teve uma discussão amarga com um colega missionário chamado Barnabé e que acabaram encerrando uma longa parceria. Palavras duras não ajudam em nada a expansão da obra de Deus.

O senhor escreveu muitas cartas às igrejas onde trabalhou como pastor. Em uma delas, acusou um dos membros de viver com a mulher de seu falecido pai, o que fez a igreja ficar muito constrangida e a excluir o pobre rapaz.

O senhor perde muito tempo falando sobre a segunda vinda de Cristo. Suas duas cartas à igreja de Tessalônica são quase totalmente devotadas a esse tema. Em nossas igrejas, raramente falamos sobre esse assunto, que consideramos de menor importância.

Analisando friamente seu ministério, vemos que é errático e de pouca duração em cada lugar. Primeiro, a Síria, depois, Chipre, vastas regiões da Turquia, Macedônia, Grécia, Itália, e agora o senhor fala em ir à Espanha. Achamos que a concentração é mais importante do que a dissipação dos esforços. Não se pode querer abraçar o mundo inteiro sozinho.

Em um sermão recente, o senhor disse "Longe de mim gloriar-me, a não ser na cruz de Cristo". Achamos justo que possamos nos gloriar na história da nossa denominação, no nosso orçamento unificado, no nosso Plano Cooperativo e nos esforços para criarmos a Federação Mundial das Igrejas.

Seus sermões são muito longos. Em certa ocasião, um rapaz que estava sentado em um lugar alto, adormeceu após ouvi-lo por várias horas, caiu e quase quebrou o pescoço. Já está provado que as pessoas perdem a capacidade de concentração após trinta ou quarenta minutos, no máximo. Nossa recomendação aos nossos missionários é: Levante-se, fale por trinta minutos, e feche a boca em seguida.

O Dr. Lucas nos informou que o senhor é um homem de estatura baixa, calvo, de aparência desprezível, de saúde frágil e que está sempre agitado, preocupado com as igrejas e que nem consegue dormir direito à noite. Ele nos disse que o senhor costuma levantar durante a madrugada para orar. Achamos que o ideal para um missionário é ter uma mente saudável em um corpo robusto. Uma boa noite de sono também é indispensável para garantir a disposição no trabalho no dia seguinte.

A Junta prefere enviar somente homens casados aos campos missionários. Não compreendemos nem aceitamos sua decisão de ser um celibatário permanente. Soubemos que Elimas, o Mágico, abriu uma agência matrimonial para pessoas cristãs aí em Roma e que tem nomes de excelentes mulheres solteiras e viúvas no cadastro. Talvez o senhor devesse procurá-lo.

Recentemente, o senhor escreveu a Timóteo dizendo que "lutou o bom combate". Dificilmente pode-se dizer que a luta seja algo recomendável a um missionário. Nenhuma luta é boa. Jesus veio, não para trazer a espada, mas a paz. O senhor diz "lutei contra as bestas feras em Éfeso". Que raios quer dizer com essa expressão?

Pesa-me muito dizer isto, irmão Paulo, mas em meus vinte e cinco anos de experiência, nunca encontrei um homem tão oposto às qualificações desejadas pela nossa Junta de Missões Mundiais. Se o aceitássemos, estaríamos quebrando todas as regras da prática missionária moderna.

Sinceramente,

A. Q. Cabeçadura

Secretário da Junta de Missões Mundiais

Autor: Anônimo

A Espada do Espírito: http://www.espada.eti.br/cartaplo.asp

sábado, 11 de setembro de 2010

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

As Cartas de Paulo aos Coríntios

1 Coríntios

Síntese

Data: Provavelmente 59 d.C, no fim dos três anos que Paulo passou em Éfeso (At. 20.31; 1 Co. 16.5-8)

Tema: Trata-se de vários assuntos, mas todos podem ser reunidos sob o título “Conduta cristã.” Até mesmo a tremenda revelação da verdade concernente à ressurreição se relaciona com o mesmo tema (1 Co 15.58). A ocasião da Epístola foi um pedido de esclarecimento com respeito ao matrimonio e a comidas oferecidas aos ídolos (7.1 e 8.1-12); mas o apóstolo estava ainda mais preocupado por notícias que ouvira de divisões e contendas, e de um incesto (5.1).

As facções na igreja não eram devidas a heresias mas à carnalidade dos coríntios e á sua admiração da “sabedoria” grega e da eloqüência. O apóstolo reprova o espírito partidário. As desordens menores eram devidas à vaidade e a um desejo pueril (infantil) pelas línguas e dons milagrosos, mais do que pelo ensino sólido (1Co 14.1-28). Paulo defende seu apostolado porque envolve a autoridade da doutrina que fora revelada por seu intermédio.

As divisões da Epístola são duas: assuntos que Paulo ouviria; assuntos que os coríntios tinham escritos, distribuídas da seguinte forma:

Introdução: 1.1-9

Assuntos ouvidos: Desordens na igreja: 1.10 a 4.21

Irregularidades sociais: Caps. 5 a 6.8

Assuntos escritos: Irregularidades sócias: 6.9 a cap.10

Desordens na Igreja: Caps. 11 a 16

Conclusão: 16.5-24


Análise de 1 Coríntios

Introdução: 1.1-9

1. Concernente às divisões na igreja (1.10 a 4.21).

1.1. O fato das divisões (1.10-12)

1.2. O mal das divisões (1.13 a 4.5)

1.3. A causa das divisões (4.6-21)

2. Concernente às desordens na igreja (caps.5 e 6)

2.1. Com referência à disciplina (cap.5)

2.2. Com referência ao litígio (questão judicial) (6.1-11)

2.3. Com referência à pureza (6.12-20)

3. Concernente às dificuldades na igreja (caps. 7 a 14)

3.1. O caso do casamento e celibato (cap.7)

3.2. O caso da carne sacrificada aos ídolos (caps. 8 a 11.1)

3.3. O caso do culto cristão (cap.11. 2-34)

3.4. O caso dos dons espirituais na igreja (cap. 15)

Conclusão: Cap.16


A mensagem de 1 Coríntios

Em um breve resumo, podemos dizer o seguinte:

Em nenhuma epístola se manifesta o próprio caráter de Paulo de modo mais brilhante do que nesta. A asserção da sua autoridade apostólica é belamente feita com humildade e piedosa desconfiança de si mesmo (2.3 e 9.16,27). Ele emprega com diligência os meios da influência, reconhecendo-se sempre inteiramente dependente de Deus (3.6-9 e 15.10). Ele combina a fidelidade com o mais alto grau de ternura (3.2 e 4.14); e, quaisquer que sejam seus dons, a todos prefere o amor (12.31). Nisto ele serve de exemplo, não somente para os ministros, mas para todos os cristãos.

As epístolas aos Coríntios são particularmente instrutivas pelo fato de harmonizarem do modo mais admirável a linguagem de um espírito nobre e liberal com doutrinas de humilhação. Elas alimentam as mais altas esperanças humanas, e dizem-nos qual é a única maneira de se realizarem. Oferecem também às igrejas de todos os tempos, pela discussão dos mais variados assuntos, as grandes lições de unidade e caridade


A 1ª CARTA AOS CORÍNTIOS

Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho

Corinto era uma grande metrópole de origem grega. Na realidade, apesar de Atenas ser a capital, era a cidade mais importante da Grécia, por sua localização geográfica. No tempo de Paulo, era uma das maiores cidades do Império Romano, com cerca de 400.000 habitantes, um número considerável, na época (hoje já é bastante!). Ficava a 80 km de Atenas, sendo rota comercial, uma espécie de encruzilhada do mundo da época (por isso que era a mais importante da Grécia). Era a capital da província da Acaia. Paulo implantou o evangelho ali (At 18.1-3), tendo ficado um ano e meio na cidade (At 18.11). Parece que conseguiu muitos frutos em seu trabalho (At 18.9-10).

De Corinto, Paulo foi para Éfeso (At 18.18-19), onde ficou por três anos (At 20.17 e 31). Foi de Éfeso que escreveu a primeira carta aos coríntios (1Co 16.8). Na realidade, esta primeira carta foi a segunda, pois antes ele escrevera uma, que se perdeu (1Co 5.9). Os problemas na igreja eram tantos que Paulo lhe escreveu mais de uma carta e pretendia voltar à igreja para uma segunda visita (1Co 16.5-8). Anteriormente, fizera uma que, parece, nada adiantou (1Co 2.1).Já tinha enviado Timóteo para ver se ele conseguia resolver os problemas da igreja (1Co 4.17). Como este não conseguiu resolvê-los, Paulo mesmo iria (1Co 4.19). Parece que isto também não resolveu, pois ele se dispôs a uma terceira visita (2Co 12.14). Os problemas eram bem sérios, mesmo. Aliás, à exceção de Filipenses, todas as cartas foram escritas para resolver problemas nas igrejas. Mas Corinto “abusava do direito de ter problemas”. Assim podemos ver que o mito da igreja perfeita se esboroa. Para alguns, a igreja de hoje é mundana, perdida, e precisamos voltar à pureza da igreja primitiva. Mas esta não era pura. Como veremos em Corinto, a igreja primitiva tinha problemas bem mais graves que os das nossas igrejas, hoje. Isto para nós é um alento. Nunca seremos perfeitos. Isto não deve nos desestimular na carreira cristã nem nos levar a nos acostumarmos com nossas falhas. Mas deve nos lembrar que não somos as piores pessoas da história do cristianismo e saber que Deus sempre usou servos imperfeitos e falíveis. Não é perfeição que ele procura em nós. É disposição de viver com ele, de amá-lo e de servi-lo.

O TESTEMUNHO SOBRE A IGREJA

O testemunho sobre a igreja de Corinto não era bom (1Co 5.1). Se a vida moral era baixa, o ambiente interno não era melhor (1Co 1.10-12). Era uma igreja imoral e briguenta, cheia de partidos. Corinto é realmente uma incógnita. É a igreja mais carismática, mais cheia de dons, mostrada como modelo em certos segmentos carismáticos contemporâneos, mas é a pior igreja do Novo Testamento. O procedimento dos cristãos de lá era pior que o procedimento dos pagãos, como nós já lemos em 1Coríntios 5.1.

Uma reflexão séria deve ser feita aqui. Dons não significam, necessariamente, qualidade espiritual. Pode parecer estranho, mas este é o testemunho que nos fica das duas cartas aos coríntios. A santificação tem um aspecto ético que se sobrepõe ao carismático. Santificação não se relaciona a êxtases e a dons, mas ao caráter espiritual e moral da pessoa.

UM ESBOÇO DA CARTA

Para compreendermos melhor o material contido na primeira epístola, eis o seu esboço, que nos ajudará a “visualizar” o conteúdo:

1. Saudação e cumprimento – 1.1-9

2. Os partidos na igreja e a tentativa de incompatibilizá-lo com Apolo – 1.10 a 4.21

3. Um caso grosseiro de imoralidade – 5.1-13

4. A ida a tribunal de irmãos contra irmãos e casos de impureza – 6.1-20

5. Ensino sobre casamento – 7.1-40

6. Carne oferecida a ídolos e a autoridade apostólica – 8.1 a 11.1

7. Irregularidade nos cultos, o uso de véu, festas religiosas, ceia do Senhor – 11.2-34

8. Dons espirituais – 12.1 a 14.40

9. Ensino sobre a ressurreição dos mortos – 15.1-58

10. Instruções sobre a oferta, observações e saudações finais – 16.1-24

Vamos comentar estes tópicos, mesmo que sinteticamente, nesta ordem exposta.

SAUDAÇÕES E CUMPRIMENTOS

Ele escreve a carta junto com Sóstenes (1.1). Este fora chefe da sinagoga em Corinto, antes da conversão, e pagou um preço alto por isso (At 18.17). Talvez tenha sido ele quem levou a notícia da igreja a Paulo, em Éfeso. Logo na saudação, o apóstolo procura mostrar aos coríntios que eles eram chamados para viverem em santidade (1.2) e para terem uma vida irrepreensível (1.8). Não faltava nenhum dom à igreja (1.7), mas ela precisava lembrar que era chamada para santidade. Dons sem caráter não adiantam muito. Dons serviam de catarse, mas não aperfeiçoavam a igreja. A verdadeira espiritualidade deve se manifestar em caráter.


OS PARTIDOS NA IGREJA E A TENTATIVA DE INCOMPATIBILIZÁ-LO COM APOLO

Havia grupos na igreja (1.12). Um grupo era apegado a Paulo. Outro gostava mais de Apolo, que foi para a região de Corinto depois que Paulo saiu (At 18.24 e 27). O grupo judaizante, que tinha tendências para guardar o judaísmo, preferia Pedro. E havia os que se julgavam mais espirituais, que diziam ser de Cristo. Parece que a polarização era mais entre Paulo e Apolo (3.4-6). Este é um dos mais sérios problemas encontrados nas igrejas: as pessoas que se tornam donas da verdade ou do evangelho. Paulo entendeu que este o primeiro problema a atacar, a desunião na igreja. Ninguém deve se gloriar em nada, a não ser no Senhor (2.31).

Paulo tinha consciência de seu ministério e não se preocupava com a opinião dos coríntios sobre ele (4.3-4), mas corrigiu-os porque isto, emitir opinião sobre o ministério apostólico, era um problema para a igreja. Com lucidez, ele bem expôs o conceito que alguns fazem do obreiro (4.9-13). Na mente de muita gente, hoje, um pastor ou um missionário é um frustrado que não deu certo em alguma área secular e arranjou um jeito de se manter. Paulo lembra à igreja que foi ele quem os gerou espiritualmente (4.15). Como não o respeitavam? Como não valorizavam o trabalho dele? Era o mesmo que não valorizar a fé deles. Eles eram o que eram pela instrumentalidade dele. Então, seu trabalho tinha valor. A liderança de uma igreja não deve ser idolatrada, mas deve ser respeitada.

UM CASO GROSSEIRO DE IMORALIDADE

Um membro da igreja vivia amasiado com a madrasta (5.1). Paulo havia escrito pedindo que ele fosse desligado da igreja (5.9-11), mas não foi atendido. Aliás, isto mostra que houve uma carta anterior à que chamamos de primeira. Por vezes, a igreja é rápida em emitir opinião sobre as pessoas de fora e esquece as pessoas de dentro. Ele censura isto. Que a igreja cuide de si mesma, primeiro (5.12). Não apenas este caso, mas pessoas com o caráter descrito em 5.11 não deveriam desfrutar da comunhão da igreja. Por vezes somos rápido na crítica às outras pessoas, e descuidamos de nos analisarmos. Um bom lembrete.

O cidadão que vivia incestuosamente com a esposa do pai deveria ser “entregue a Satanás” (v. 5). Que significa isto? Satanás é o príncipe deste mundo (Jo 12.31 e 1Jo 5.19). A igreja deveria considerá-lo como pertencente a Satanás. Sua conduta não era de alguém pertencente a Cristo. “Entregue” deve ser entendido neste caso: a igreja é propriedade de Cristo e Satanás não tem poder sobre ela (1Jo 5.18). Sendo tirado da comunhão da igreja, esta o deixaria na mão do poder maligno, para que ele aprendesse como Satanás é mau e se arrependesse. Foi isso que Paulo fez com Himeneu e Alexandre (1Tm 1.20).

Paulo insiste em que a igreja deve desligar esta pessoa, a quem chama de iníquo (5.13). Há pessoas que não têm condições de serem membros da igreja e esta precisa permanecer atenta a isto.


A IDA A TRIBUNAL DE IRMÃOS CONTRA IRMÃOS E CASOS DE IMPUREZA

Membros de igreja têm problemas entre si. Isto faz parte da natureza humana. Mas deveriam resolver sem necessitar recorrer a tribunais humanos. Ele trata disto em 6.1-6. E faz uma observação em 6.7: só o haver demandas entre eles já era uma vergonha. Dissensões na igreja são uma vergonha para o testemunho.

Paulo associa este caso com a impureza moral da igreja (6.8-10). Parece que o padrão moral da igreja era baixo mesmo. A igreja não poderia ser assim. Tivera uma experiência com Cristo, como ele diz em 6.11. Quem teve uma experiência com Cristo não pode ter uma conduta pior do que a conduta de quem não teve. Temos falhas, mas não podemos ter uma vida mais baixa que a dos depravados do mundo sem Cristo.

Em 6.12 o apóstolo deixa um princípio importantíssimo para nossas vidas. Todas as coisas nos são permitidas, mas algumas delas devemos evitar. Nosso corpo é o santuário do Espírito (6.19). Isto não significa que o Espírito habita na nossa carcaça física. “Corpo” é o grego sômata, de sôma, a personalidade integral. Não é o físico, mas sim a integralidade da pessoa, sua psiqûe, o centro de emoções e decisões, mais do que mera estrutura física. “Santuário” é o grego naós, que era usado para designar o lugar do templo de Jerusalém em que ficava a arca, onde só o Sumo Sacerdote entrava, e assim mesmo, uma vez por ano. Era a morada de Deus. É na nossa integralidade, na nossa psiquê, que Deus mora. Não é no corpo físico que ele mora. Se amputarmos um membro do corpo, isto não significa que Deus vai ficar com menos espaço para morar. Nem os magros e pequenos terão Deus mais apertado dentro de si. E os gordos e grandes não estarão com mais espaço para Deus viver mais confortavelmente dentro deles. Não é o corpo físico, como muitos pensam.

Se Deus morar na sôma, no centro emotivo e decisório da pessoa, não haverá lugar para imoralidade. Este é o princípio da santidade moral, a presença de Deus na nossa vida. Santidade não é externalidade nem grito no culto, mas o cultivo da presença de Deus na nossa vida, no centro decisório e volitivo de nossa personalidade.


ENSINO SOBRE CASAMENTO

Havia muita confusão sobre esta questão, na igreja. O capítulo 7 é longo e trata do casamento, mostrando como a igreja tinha dificuldades nesta área. Ao mesmo tempo vemos como o mundo da época, mundo que a igreja copiava, também era confuso neste ponto.

A primeira declaração de Paulo é problemática (7.1). Ela se choca com Gênesis 2.18. por isso devemos entender que ele está dizendo. Conforme Morris: “Havia na antigüidade uma generalizada admiração pelas práticas ascéticas, incluindo-se o celibato. Pelo menos alguns dos coríntios partilhavam dessa admiração. Paulo faz todas as concessões aos pontos de vista deles. Concorda que o celibato é ‘bom’ e expõe algumas de suas vantagens. Mas considera o casamento como normal”. É bom, mas não é necessário nem é moralmente melhor que o homem não toque mulher. Ele não defende o celibato. Aponta para o perigo de se procurar a prostituição (muito comum e vista como prática religiosa, pelos pagãos). Mostra que Satanás trabalha nesta área (v. 5).

Há deveres no casamento (7.3-5). Deve haver um acordo entre os cônjuges sobre questões sexuais.

Ele defende o casamento sem rompimento (7.10-11), mas reconhece que, quando é tomada a iniciativa por uma das partes, a outra está livre (7.15). Havia um grupo, na igreja, que defendia o celibato. Paulo diz a eles que fiquem como estão. Não se casem. Querem ser celibatários? Que o sejam. Mas se alguém quiser casar, que se case (7.27-28). Mas muitos dos conceitos emitidos por Paulo foram pronunciados por ele na perspectiva de que a vinda de Jesus estava bem perto (7.29). Isto deve ser levado em conta. Um exemplo disto se vê no celibato que ele praticava e que gostaria que outros praticassem. O próprio Paulo tinha o dom de poder viver sem esposa, por isso podia se dedicar totalmente à obra de Deus, em longas viagens missionárias e prisões pelo evangelho, porque não tinha família para cuidar (7.7 e 32-34). Na perspectiva de uma vinda iminente de Jesus, como se presumia numa fase em que o pensamento teológico da igreja ainda não fora completado, poder dedicar-se à pregação como ele fazia, era muito bom. Todo o capítulo traz um pano de fundo escatológico, ou seja, de que se viviam os últimos tempos da história.

CARNE OFERECIDA A ÍDOLOS E A AUTORIDADE APOSTÓLICA

Esta é a maior seção da epístola. Em Corinto havia muitos templos pagãos. Havia o culto a Poseidon, o pseudodeus do mar. Havia o culto à pseudadeusa Roma, o culto ao imperador e o templo a Afrodite, a pseudadeusa do amor, com mil sacerdotisas prostitutas, que eram tidas como santas, por dedicarem seus corpos à divindade em ritos sexuais. Neste templo havia o dom de línguas frenéticas, ou o dom de línguas como praticado em algumas igrejas pentecostais hoje.

Muitos templos tinham cultos em que carne era sacrificada aos ídolos. A carne era vendida no açougue pelos sacerdotes. Eis a questão: comer ou não comer carne? Afinal, podia estar se comendo coisa sacrificada a ídolos. Ora, o ídolo não existe, não é nada, não tem poder algum (8.4-6). Deus sabe quem o ama (8.3) e não seria comer carne que, eventualmente, foi consagrada a um ídolo que faria diferença (8.8). Apenas não devemos ir a uma festa pagã para comer a carne (8.10) por causa do testemunho. Devemos evitar servir de tropeço uns aos outros (8.13).

A seguir, mudando de assunto, mas seguindo no mesmo ritmo, Paulo começa a defender sua autoridade apostólica. Assim como alguns pensavam no seu direito e não do outros, ele defende seus direitos também. Parece que alguns não concordavam com sua orientação e se julgavam mais espirituais ou com mais autoridade do que ele. Paulo defende o direito de ser sustentado por pregar o evangelho (9.7-11). Ele trabalhava, fazendo tendas, quando fundou a igreja (At 18.3). Ele nunca se valeu do direito de ser sustentado por pregar o evangelho (7.12), mas tinha este direito, como lemos em 7.7, 13-14. E explana bem a questão, nestas passagens.

IRREGULARIDADE NOS CULTOS, O USO DE VÉU, FESTAS RELIGIOSAS, CEIA DO SENHOR

É uma seção longa (11.2-34) e trata de questões litúrgicas. Muito do que aqui está nos parece sem sentido porque seu contexto é cultural, em grande parte. Este é um desafio para nós: o que é princípio de valor temporário e o que princípio de valor permanente, na Bíblia?

Aquilo que está totalmente ligado à cultura é de valor temporário, não sendo princípio eterno. No Oriente antigo, a mulher não deveria aparecer de cabelos soltos ou descobertos. Isto não acontece hoje. Quando estudei no Seminário do Sul, e tínhamos aulas de pregação, devíamos ir de terno e gravata. O professor examinava nossa indumentária. Perdi pontos por usar sapatos sem cadarços, e isto era inconcebível para um pastor. Sapatos sem cadarços eram tido como esportivos, não combinando com terno. Em muitas igrejas estas questões ainda permanecem: cumprimento de roupa, maquiagem, corte de cabelo, etc. Há igrejas que, em pleno século 21, ainda proíbem homens e mulheres de sentarem juntos, como se fazia no século 19.

O princípio fundamental nas instruções de Paulo é o respeito pelo local de culto e pelo culto, propriamente dito. A questão de ausência do véu servia de escândalo. Que se evitasse o escândalo! Os cultos dos coríntios eram motivo de escândalo. Faziam mais mal do que bem (11.17).

Havia uma refeição comum nas igrejas, chamada de ágape. Era um momento de comunhão. Parece que se seguia à ceia, que era a parte última do culto. As pessoas traziam sua comida de casa. Parece que em Corinto fundiram a ceia e o ágape. Os ricos traziam muito e exibiam finas iguarias, e os pobres passavam necessidades e havia bebedeiras (11.20-22). Paulo diz que isto não era a ceia (v. 20) e passa a explicar a ceia. Ele recebeu esta forma de celebração da ceia. Fica em aberto se a recebeu do Senhor Jesus ou de outros apóstolos, mas fica certo que pelo ano 50 de nossa era, a igreja já seguia esta prática de celebrar a ceia. Ela é um ato memorial (vv. 24-25), ou seja, ela lembra o sacrifício de Jesus na cruz. Oportuna lição! A igreja nunca pode perder de vista o sacrifício de Jesus, nunca deve deixar de comemorá-lo. Ela existe por causa dele.

A ceia exige por parte de seus participantes um exame retrospectivo (11.27-29), um exame de consciência. Paulo associa a doença e a morte de alguns membros da igreja como castigo divino por sua irresponsabilidade e leviandade espiritual (v. 30). Isto pode nos soar estranho, mas deve receber nossa reflexão. As realidades espirituais, que são sagradas, devem receber de nossa parte o maior respeito. E nossa participação no culto deve ser feita com seriedade.


DONS ESPIRITUAIS

A seção sobre dons espirituais vai do capítulo 12 até o capítulo 14. O tema é o mesmo nestes três capítulos. O capítulo 13 não é parêntesis, como se quebrasse a argumentação que surge em 11 e 12, mas é a apresentação do maior dom, que é o amor. Pode se ter todos os demais, mas sem este, nenhum vale coisa alguma (13.1)

Novamente precisamos ter em conta, para um bom entendimento do assunto, que a igreja estava em formação, que o Novo Testamento estava sendo escrito, e que as características daquela época eram bem diferentes das nossas. Os apóstolos eram poucos, as distâncias entre as igrejas eram enormes e, conseqüentemente, os contatos das igrejas eram escassos, os meios de transporte eram lentos e a comunicação era precária. As igrejas estavam infestadas de falsos mestres fazendo afirmações que Jesus nunca fizera, e sem respaldo algum (por isso, o dom de discernimento, mostrado em 12.10 (veja, principalmente, na NTLH).

O que domina a discussão nos capítulos 12 e 14 é o dom de línguas. Como é mostrado em Corinto, parece mais uma algaravia de sons extáticos que o que realmente houve no dia de pentecostes, conforme relato de Atos dos Apóstolos. Em Atos 2, no dia de pentecoste, as línguas foram inteligíveis (At 2.8), e em Corinto não o eram (1Co 14.9 e 16). Em pentecoste, as línguas falaram aos homens (At 2.6-8) e em Corinto, falavam a Deus (1Co 14.2). Em pentecoste não houve necessidade de intérprete (At 2.8) e em Corinto havia (1Co 14.5 e 14.13). Em pentecoste houve edificação das pessoas (At 2.11) e em Corinto havia dissensão, orgulho e escândalo (1Co 14.23). Em pentecoste, o falar em línguas ajudou a muita gente, preparando-as para a mensagem de Pedro, e levando-as à conversão (At 2.41), e em Corinto ajudava apenas o falante (1Co 14.4 e 14.17). Tecnicamente, em pentecoste houve um caso de xenoglossia (falar línguas estrangeiras) e em Corinto, um caso de glossolalia (falar sílabas desconexas, em êxtase). Mas o texto de Atos 2.8 nos deve levar a uma consideração: a ênfase não estava no falar, mas no ouvir! Não era como os discípulos falavam, mas como os ouvintes entendiam em sua língua. Foram idiomas ou dialetos compreensíveis, entendíveis.

Mas tudo em Corinto resvalava para dissensões. Os dons, que deveriam edificar, serviam para fragmentar a igreja. Por isto, no meio da discussão, o capítulo 13. Já vimos muita vigília de oração para se receber o dom de línguas. Quando veremos uma vigília e a proclamação de jejum, para aprendermos a amar?

Mas observemos os dons, como relatados nos versículos 8-10: palavra de sabedoria, palavra de conhecimento, fé, dons de curar, operações de milagres, profecia, discernimento de espíritos, variedade de línguas e interpretação de línguas. Mas o ponto central da discussão deve ser o capítulo 13 porque o amor relativiza todos os demais dons.

ENSINO SOBRE A RESSURREIÇÃO DOS MORTOS

É o trecho de 15.1-58. Este é, sem dúvida, o mais grandioso capítulo de toda a Bíblia. Vale a pena lê-lo todo, em seqüência. É a pedra de toque da esperança cristã. Se Jesus fosse Deus, tivesse nascido de uma virgem, tivesse morrido pelos nossos pecados na cruz e tudo se acabasse na sepultura, não haveria cristianismo. Isto é obvio.

Mas a igreja, tão cheia de dons, era cheia de erros doutrinários. Conforme o v. 12, havia gente que negava haver alguma coisa como ressurreição de mortos. Mas Paulo é muito enfático e afirma com segurança que se não há ressurreição de mortos, o cristianismo não faz sentido algum (vv. 13-19).

A pregação da igreja repousava sobre algumas verdades inconfundíveis; (1) Jesus era o messias esperado; (2) ele fora morto; (3) ele ressuscitara; (4) ele voltará. No primeiro sermão da igreja, Pedro deixou isto bem claro (At 2.31) e voltou a reafirmá-lo em um segundo sermão (At 3.15) e insistiu nisto (At 4.2 e 11). A base de tudo é que Jesus ressuscitou. Esta é a nossa garantia de nossa ressurreição (1Co 15.20-23).

A ressurreição de Jesus é fato bem documentado. Além das várias aparições aos apóstolos, isolados ou em grupos, numa vez ele aparecera a cerca de 500 pessoas, sendo que alguma delas ainda vivia (v. 6). Era como se Paulo dissesse; “Vocês não acreditam? Vão lá e perguntem aos que viram!”.

A ressurreição de Jesus é a garantida nossa (15.20-28). Paulo faz uma analogia com Levítico 23.10-11. Os primeiros frutos que o lavrador trazia para serem ofertados a Deus como as primícias anunciavam a colheita próxima. A ressurreição de Jesus é assim: o prenúncio da ressurreição de todos os crentes. E depois argumenta com Gênesis 3.17-19. Assim como a morte entrou no mundo por Adão, a vida entrou no mundo por Jesus (v. 22). Ele venceu a morte porque era sem pecado. Na conversão nós somos identificados com ele, ligados a ele. Seremos tornados sem pecado (1Jo 3.2) e ressuscitaremos para viver para sempre.

Um aspecto confuso é o da questão do batismo pelos mortos (vv. 29-34). Quando alguém estava se preparando para o batismo e morria, um parente ou amigo recebia esta cerimônia por ele. Paulo não aprova nem desaprova o ato. Apenas o menciona, como argumento ad hominem, para levá-los a aceitar a ressurreição como fato. Eles criam, com esta prática estranha. Como negavam com palavras?

A ressurreição do corpo ocupa longa seção (vv. 35-49). O argumento paulino é simples. Cristo ressuscitou com um corpo que pôde ser visto e apalpado (Lc 24.36-43 e Jo 20.27). Foi uma ressurreição física, não algo místico. Já sabemos que Corinto era uma cidade grega. Para os gregos, o corpo não tinha valor, sendo apenas a prisão da alma. Por que ressuscitá-lo? A idéia de ressurreição pregada pelos cristãos era motivo de zombaria dos gregos (At 17.31-32). Mas para os cristãos, a matéria não é má, como era para os gregos. O corpo não é mau. Deus assumiu um corpo, na pessoa de Jesus! E assim Paulo faz quatro afirmações:

(1ª) O corpo presente é corruptível; o corpo futuro será incorruptível;

(2ª) O corpo presente é desonra; o corpo futuro será glória;

(3ª) O corpo presente é fraco; o corpo futuro ressuscitará em poder;

(4ª) O corpo presente é natural; o corpo futuro será espiritual.

Daqui passa ele para a conquista da morte (vv. 50-58). É um trecho de magnífica poesia épica. Precisamos ser transformados, mas não devemos temer isto. Nem todos morrerão porque quando Cristo vier, os que estiverem vivos serão transformados (v. 52). Os mortos ressuscitarão primeiro, mas os vivos serão transformados. Será o fim da morte. Isto deve suscitar duas atitudes em nós. A primeira é gratidão a Deus por este final tão glorioso que teremos (v. 57). O segundo é que devemos continuar firmes na fé, sem nunca desanimar (v. 58). Nosso trabalho e nossa carreira cristã não são sem sentido.


AS INSTRUÇÕES FINAIS

O capítulo 16 traz as instruções finais, começando por uma orientação sobre a oferta que aqueles cristãos, de melhor situação financeira, deviam fazer pelos menos favorecidos, os da Judéia, que enfrentavam grande perseguição e tinham seus bens confiscados (16.1-5). Há um princípio aqui que deve reger nosso relacionamento: nossos bens servem para beneficiar outros, principalmente nossos irmãos desfavorecidos. Devemos viver em mutualidade.

Os capítulos finais das cartas paulinas são muito enriquecedores e até mesmo cheios de ternura. Aparece seu relacionamento pessoal com os crentes, as palavras de saudações, estímulo e reconhecimento do caráter de muitos deles. Paulo expressa o desejo de visitá-los, não apenas de passagem, mas permanecendo algum tempo com eles (vv. 5-7). Havia uma fraternidade, uma vivência de relacionamento entre aqueles crentes que nossas igrejas perderam hoje. Cada um de nós assiste um culto e sai para sua vida em seu apartamento, sem viver em relacionamento com os demais. Eles se visitavam, se hospedavam, se socorriam, se envolviam uns com os outros.

O apóstolo está entrado em anos, mas continua pregando e embora tenha oposição, não faz conta disto (vv. 8-9). Ele tem uma missão e quer cumpri-la. Não busca aplausos, mas apenas deseja cumprir seu dever para com Cristo. É um modelo de obreiro: trabalhar até morrer sems e preocupar com os críticos.

E ainda tem tempo de orientar a igreja no trato com dois obreiros, Timóteo e Apolo (vv. 12-12). Timóteo foi o substituto de Paulo na organização das igrejas, na administração dos missionários. Na época das cartas era o assistente de Paulo. Apolo foi o grande orador, pregador itinerante. A igreja precisa de burocratas, administradores, e de missionários. De pessoas mais tímidas, como Timóteo parece ter sido, e pessoas mais exuberantes, como Apolo parece ter sido. Somos diferentes, mas todos temos espaço para servir a Deus dentro de sua igreja e do seu reino.

Nas recomendações finais, elogios a Estéfanas, que, tudo indica, era o pastor da igreja (vv. 15-16). Se não era o pastor, era diácono ou um líder expressivo. Sua liderança deveria ser acatada e ele tinha visitado Paulo, acompanhado de mais dois irmãos (v. 17). E que bonita expressão sobre eles: “Gente como essa merece elogios” (v. 18, Linguagem de Hoje). Não devemos servir a Deus para receber elogios, mas pode se dizer isto a nosso respeito, que merecemos elogios?

Áquila e Priscila estavam lá, em Éfeso, e a igreja se reunia na casa deles (v. 19). As igrejas não tinham templos e se reuniam em casas. Na realidade, o lar de cada crente em Jesus deveria ser uma igreja, um pólo de irradiação do evangelho.

CONCLUSÃO

A carta começa com dureza e termina com ternura, nas saudações. Mas o final textual é muito bonito. Paulo escreve a oração que era feita pela igreja primitiva: Marana Tha, expressão aramaica que significa “Vem (com sentido de rapidez), nosso Senhor!” (v. 22). O desejo pela volta de Jesus deve ser nossa oração. E ele conclui com uma bênção, como fez em todas as cartas: que a graça de Jesus estivesse com eles, e o amor dele, Paulo, estava com eles.

Suas últimas palavras são estas: “Pois estamos unidos com Cristo Jesus!” (v. 24). Que os seguidores de Jesus Cristo nunca se esqueçam disto: estamos unidos com Jesus.

Ir além

“Se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com ele duas.” Mateus 5:41



Fazer o óbvio é, na maioria das vezes, fácil e prático. Ir além das expectativas e até superá-las, este é o maior desafio.

Somos testados a cada dia. No emocional, no pessoal, no espiritual e sempre acreditamos que não conseguimos ir além do que já fazemos.

No emocional, chegamos a impor o limite do nosso sentimento. “Não vou me apaixonar de novo! Não pretendo sofrer outra vez!”

No pessoal olhamos ao nosso redor e nos acomodamos com o que temos e em como estamos, preferimos nos estagnar e dizemos: “Já está muito bom assim!”

No espiritual, acreditamos que algumas lágrimas já são o sinal real da presença de Deus, e nos acomodamos!

Ir além.

Jesus, neste começo do Sermão do Monte, já mostra o que iriam passar aqueles que O seguiam. Seriam levados a superar as suas próprias forças, sempre em favor do outro.

Somos totalmente dependentes das pessoas que nos rodeiam. De uma forma ou de outra, acabamos tendo que recorrer a alguém para pedir um auxílio. E quando chegam até a nós pedindo um socorro, precisamos superar o desafio que nos é proposto. Andar a segunda milha!

A segunda milha pode estar em um pequeno aperto de mão ou um abraço apertado. Nada de sobrenatural!

A segunda milha pode estar na tua sinceridade em olhar nos olhos do teu irmão e dizer o quanto você o ama ou o quanto você não está feliz com ele.

A segunda milha pode ser o teu desejo de expressar, de forma clara, a tua gratidão à Deus por tudo o que Ele já te fez.

“Se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com ele duas.”

Supere o preconceito!

Supere a ingratidão!

Supere o medo!

Supere a insegurança!

Você é capaz de ir além. Você é capaz de andar mais uma, duas, dez, cem milhas. Sabendo que nesta caminhada você não está sozinho. Ao teu lado está o Senhor Jesus que andou várias milhas prá que você desse o primeiro passo nesta jornada.



Deus te abençoe!

quinta-feira, 8 de julho de 2010

A TEORIA PEDAGÓGICA DE RUBENS ALVES

A Teoria Pedagógica de Rubem Alves


INTRODUÇÃO

Rubem Alves e a Alegria de Ensinar


“Nossos dias são preciosos, mas com alegria os vemos passando se no seu lugar encontramos uma coisa mais preciosa crescendo: uma planta rara e exótica deleite de um coração jardineiro, uma criança que estamos ensinando, um livrinho que estamos escrevendo”.
O que pode haver de mais singelo quando vemos algo que projetamos ser realizado, ser colocado em prática e seguido por uma infinidade de pessoas e culturas? Realmente não há preço que se pague nem sentimento que se expressem, só nos resta admirar e refletir o quanto trabalhamos para que aquilo fosse concluído.
Quando procuramos falar na teoria pedagógica de um ícone da educação como Rubem Alves, um cuidado muito grande precisa ser tomado para que não teorizemos o que já pratica e deseja que outros também o façam.
O poema que inicia este texto tem em seu centro um sentimento que faz parte da maioria dos seres humanos, expresso de várias formas e que nunca se perde, ou pelo menos não deveria, com o tempo: A Alegria.

“Da alegria não se aposenta...” e é bem verdade esta afirmação.

Os técnicos em educação desenvolveram métodos de avaliar a aprendizagem e, a partir dos seus resultados, classificam os alunos. Mas ninguém jamais pensou em avaliar a alegria dos estudantes – mesmo porque não há métodos objetivos para tal. Porque a alegria é uma condição interior, uma experiência de riqueza e de liberdade de pensamento e sentimento.
É necessário que se goste de fazer para fazer e não ser obrigado a fazer aquilo que não gosta. Tenho que ter interesse, vontade e alegria por fazer.
A globalização impõe o desenvolvimento de habilidades que possibilitem uma melhor adaptação às novas culturas e aos novos padrões de cultura social e, direta ou indiretamente isto afeta a educação, a forma de como se ensina.

O tempo é o senhor da vida e por isto não pode ser perdido.

Quando este conceito é aplicado à pedagogia, por exemplo, já não há mais aquele tempo para os pequeninos aproveitarem os brinquedos pedagógicos: bola de gude, pipa, carrinho, boneca de pano. Estes não têm função nenhuma de ensino. É o que dizem!
Desde cedo já são levados a “aprenderem” novas línguas, novos conceitos para não ficarem retrógrados aos acontecimentos e com isto perdem a alegria pelo aprendizado, pois este só tem uma função: Formatar e não formar.
Se fizer uma pesquisa entre as crianças e os adolescentes sobre as suas experiências de alegria na escola, eles terão muito que falar sobre a amizade e o companheirismo entre eles, mas pouquíssimas serão as referências à alegria de estudar, compreender e aprender.
O perfil da educação no Brasil apresentou mudanças significativas nas últimas décadas. O desempenho dos alunos remeteu-se a necessidade de considerarem a formação do professor, como sendo requisito fundamental para a melhoria dos índices de aprovação, repetência e evasão do ensino.
O que se deve considerar é que o ato de ensinar e aprender é uma constante troca, onde se torna imprescindível que o professor seja, a cima de tudo, um educador que enfrente desafios e possa encarar os problemas presentes na sua formação e, assim compreender que o conhecimento se processa através de valores que embasam e justificam a aprendizagem, relações interpessoais dos sujeitos envolvidos no processo e o que vivenciam em sala de aula.

Ter alegria ao ensinar!

“O mestre nasce da exuberância da felicidade. E, por isso mesmo, quando perguntados sobre a sua profissão, os professores deveriam ter coragem para dar a absurda resposta: ‘Sou um pastor da alegria... ’ Mas, é claro, somente os seus alunos poderão atestar da verdade da sua declaração...”.

Veremos neste breve trabalho que, para Rubem Alves, educar é motivar para a existência.


RUBEM ALVES POR RUBEM ALVES

“Nasci no sul de Minas Gerais, Boa Esperança, antigamente, quando nasci, Dores da Boa Esperança: tinha de ser dor de parto. Lá tem uma serra que o Lamartine Babo, ferido por um amor impossível, transformou em canção. Meu pai era rico, quebrou, ficou pobre. Tivemos de nos mudar. ‘Quando a desgraça é profunda, que amigo se compadece?’ Sofri muito no Rio de Janeiro, adolescente caipira freqüentando colégio de classe média. Grande solidão. A religião me acolheu. Admirei Albert Schweitzer, teólogo protestante, organista, medico, premio Nobel da Paz. Quis seguir o seu caminho. Tentei ser pianista. Fracassei. Sobrava-me vontade e disciplina. Faltava-me talento. Fui pastor no interior de Minas, convivi com gente simples, minhas idéias sobre os mistérios sagrados não agradaram aos poderosos da denominação protestante à qual eu pertencia. Fui estudar em Nova Iorque, voltei um mês depois do golpe militar, fui denunciado pelas autoridades da Igreja Presbiteriana do Brasil como comunista e subversivo, minha família e eu tivemos de sair do Brasil, fui estudar em Princeton, onde escrevi coisas que, posteriormente, virariam a Teologia da Libertação. O tempo passou, voltei ao Brasil, mudou o meu jeito de pensar. Golpes duros da vida me fizeram descobrir a literatura e a poesia. Aí, pude começar a realizar o meu sonho de ser músico: comecei a fazer música com as palavras.

Leituras de prazer especial: Nietzsche, T.S. Eliot, Kierkegaard, Camus, Lutero, Agostinho, Guimarães Rosa, Tao Te Ching, o Eclesiastes, Bachelard, Octávio Paz, Borges, Barthes, Michael Ende. Pintura: Bosch, Bruegel, Grünenwald, Monet. Música: César Frank, Keith Jarret, Pink Floyd, Milton, Chico, Tom Jobim, que acabava de ficar encantado. Minha filosofia pode ser resumida em frases latinas:

- Tempus fugit – o tempo foge, passa rapidamente, tudo é espuma.

- Carpe Diem – portanto, colha o dia como um fruto saboroso na parede do abismo.

Descobri que muitas estórias infantis moram dentro de mim, adormecidas. Vez por outra uma delas acorda, e eu capturo com minha gaiola de palavras: um livrinho. Mas cada leitor pode abrir uma portinhola, e o passarinho voa livre de novo. Já tive medo de morrer. Não tenho mais. Mas a morte é minha companheira. Sempre conversamos e aprendo muito com ela.

Quem não se torna discípulo da morte está condenado a ser tolo a vida inteira “

“Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos fragmentos de futuro em que a alegria é servida como sacramento, para que as crianças aprendam que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um fragmento do futuro...”.

Rubem Alves


PROFESSOR OU EDUCADOR? A RELAÇÃO ALUNO/PROFESSOR

Rubem Alves faz uma distinção entre o professor e o educador:

O primeiro é aquele que se vê como mero transmissor de conhecimento e o segundo é aquele que busca, por meio da transmissão de conhecimentos, de maneira crítica e reflexiva, contribuir para que o aluno possa desenvolver-se, superar-se, realizar-se, como indivíduo e como cidadão.

Perfis diferentes e, infelizmente, pouco observados em suas essências.

Uma necessidade maior se faz neste processo que podemos chamar de relacionamento ou relação entre Professor/Educador e o aluno.

“O momento atual impõe ao profissional de educação desenvolver habilidades que possibilitem uma melhor adaptação às novas culturas e aos novos padrões de conduta social. Além disso, o acelerado processo de globalização em que se encontra o país insere o homem em um ambiente de alta competitividade e seletividade. Nesse contexto, a relação professor-aluno representa um esforço a mais na busca da praticidade, afetividade e eficiência no preparo do educando para a vida, numa redefinição do processo ensino aprendizagem.
Não obstante, cada profissional deve ter claramente definido o seu papel nesse contexto social, onde esta relação aqui considerada passa a ser alvo de pesquisas, na busca do diálogo, do livre debate de idéias, da interação social e da diminuição da importância do trabalho individualizado.

A interação professor-aluno ultrapassa os limites profissionais, escolares, do ano letivo e de semestres. É, na verdade, uma relação que deixa marcas, e que deve sempre buscar a afetividade e o diálogo como forma de construção do espaço escolar, trazendo à tona algumas questões norteadoras:

a) de que maneira a relação professor-aluno interfere no processo ensino aprendizagem?

b) como fazer com que a relação professor-aluno torne-se um alicerce para a construção do conhecimento?

c) como trabalhar a relação professor-aluno imbuída de afetividade e diálogo para a formação de um cidadão mais crítico, consciente e participativo.

Objetivamente, busca-se desvelar o âmago da relação professor-aluno diante dos problemas educacionais, buscando com isso lançar uma reflexão acerca do processo de construção do conhecimento. Especificamente, a intenção é de identificar os fatores que dificultam o relacionamento entre professor e aluno, compreender como uma boa relação entre estes atores contribui para o processo de ensino-aprendizagem e, ao final, propor alternativas que possam contribuir para a melhoria do relacionamento aqui trabalhado, numa perspectiva de aprendizagem significativa e satisfatória.

Ser professor não constitui uma tarefa simples, ao contrário, é uma tarefa que requer amor e habilidade”.

“Pense sobre isto: um chato é uma pessoa que não sabe brincar com o inexistente. É aquela pessoa que, depois de ouvir a piada que faz todo mundo rir, faz a pergunta: Mas isto aconteceu mesmo?”

Rubem Alves.


O SABER QUE É DADO

“E chega o momento quando o Mestre toma o discípulo pela mão, e o leva até o alto da montanha. Atrás, na direção do nascente, se vêem vales, caminhos, florestas, riachos, planícies ermas, aldeias e cidades. Tudo brilha sob a luz clara do sol que acaba de surgir no horizonte. E o Mestre fala:

‘Por todos estes caminhos já andamos. Ensinei-lhe aquilo que sei. Já não há surpresas. Nestes cenários conhecidos moram os homens. Também eles foram meus discípulos! Dei-lhes o meu saber e eles aprenderam as minhas lições. Constroem casas, abrem estradas, plantam campos, geram filhos...

Vivem a boa vida cotidiana, com suas alegrias e tristezas. Veja estes mapas!’

Com estas palavras ele toma rolos de papel que trazia debaixo do braço e os abre diante do discípulo.

‘Aqui se encontra o retrato deste mundo. Se você prestar bem atenção, verá que há mapas dos céus, mapas das terras, mapas do corpo, mapas da alma. Andei por estes cenários. Naveguei, pensei, aprendi. Aquilo que aprendi e que sei, está aqui. E estes mapas eu lhe dou, como minha herança. Com ele você poderá andar por estes cenários sem medo e sem sustos, pisando sempre a terra firme. Dou-lhe o meu saber”.

Quando se dá algo para alguém é por que existe um carinho, um amor especial por este alguém.

Com o saber pode-se dizer a mesma coisa. O mesmo só é dado se existe amor e carinho por quem está dando.

Anos e anos são investidos em pessoas que, mais tarde, estarão lembrando daquele ou daquela professora que as iniciaram em seus estudos. Que foram amáveis e pacientes com elas. Que acreditaram nelas enquanto outros recusaram o desafio.

Os saber lhes foi dado e agora será retransmitido.

Na sua forma de Educar, Rubem Alves não só se preocupa em como educar, mas como fazer com que esta educação seja transmitida para a posteridade.

Em um dos seus pensamentos ele sintetiza: “Entendo assim a tarefa primeira do educador: dar aos discípulos razões para viver. Tudo mais são complementos”.

“O sabor e o poder só se justificam como panelas onde se prepara a alegria de viver. O objetivo do saber é aumentar as nossas possibilidades de sentir sabor”.

Rubem alves



CONCLUSÃO

A ALEGRIA DE ENSINAR

“Muito se tem falado sobre o sofrimento de ser professor. Eu, que ando sempre na direção oposta e acredito que a verdade se encontra no avesso das coisas, quero falar sobre o contrário: a alegria de ser professor, pois o sofrimento de ser um professor é semelhante ao sofrimento das dores de parto: a mãe aceita e logo dele se esquece, pela alegria de dar à luz um filho”. Rubem Alves
O ponto central de toda a explanação foi a alegria. A alegria por fazer aquilo que se gosta e a alegria de receber aquilo que estão passando. Neste caso vemos os dois lados. O de quem ensina e o de quem aprende.

Foi tomado como base da pedagogia deste grande “ensinador” a alegria de ensinar.

Rubem Alves nos apresenta este legado e nos deixa claro que aquilo que se faz com prazer e com alegria se torna mais produtivo e com mais chances de ser passado para as próximas gerações. Ele é prova viva disto.

Repito o já dito no começo deste trabalho: “Quando procuramos falar na teoria pedagógica de um ícone da educação como Rubem Alves, um cuidado muito grande precisa ser tomado para que não teorizemos o que já pratica e deseja que outros também o façam”.

Se muito falamos, pouco agimos, e neste caso a teoria pedagógica de Rubem Alves se mostra com atitudes, com ação e não somente com teorização.

O transmitir o que se sabe com alegria e prazer é o ponto fundamental de uma pedagogia prática e próspera. Ainda que haja dores quando se ensina, o fruto deste “parto” será uma bela “criança” nova ou velha, conhecedora do desconhecido e desejosa por passar adiante aquilo que lhe foi ensinado com prazer.




Bibliografia:

Livros:

1. Alves, Rubem Azevedo, 1993 - Conversas com quem gosta de ensinar / Rubem Azevedo Alves: São Paulo: Ars Poética, 1995;

2. Alves, Rubem, 1993 – A Alegria de Ensinar / Rubem Alves – São Paulo: Ars Poética, 1994.



Sites:

1. A casa de Rubem Alves: www.rbemalves.com.br;

2. Rubem Alves – Biografia: www.releituras.com;

3. Entrevista: www.revistaepoca.globo.com


segunda-feira, 28 de junho de 2010

ESPIRITUALIDADE E CORPOREIDADE NA UNIDADE FUNDAMENTAL DA PESSOA HUMANA

“Quando vier o Filho do homem na sua majestade e todos os anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória; e todas as nações serão reunidas em sua presença, e ele separará uns dos outros, como o pastor separa dos cabritos as ovelhas; e porá as ovelhas à sua direita, mas os cabritos à esquerda; então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome e me deste de comer; tive sede e me deste de beber; era forasteiro e me hospedastes; estava nu e me vestistes; enfermo e me visitastes; preso e foste ver-me. Então perguntarão os justos: Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer? Ou com sede e te demos de beber? E quando te vimos forasteiro e te hospedamos? Ou nu e te vestimos? E quando te vimos enfermo ou preso e te fomos visitar? O Rei respondendo, lhes dirá: Em verdade vos afirmo que sempre que o fizeste a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes. Então o Rei dirá também aos que estiverem à sua esquerda: apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos. Porque tive fome e não me deste de comer; tive sede e não me deste de beber; sendo forasteiro, não me hospedastes; estando nu não me vestistes; achando-me enfermo e preso não fostes ver-me. E lhes perguntarão: Senhor, quando foi que te vimos com fome, com sede, forasteiro, nu, enfermo ou preso e não te assistimos? Então lhes responderá: Em verdade vos digo que sempre que o deixastes de fazer a um destes mais pequeninos, a mim o deixastes de fazer. E irão estes para o castigo eterno, porém os justos para a vida eterna”.( Mateus 25:31-46).


Antes de entrar no texto do livro: Unidade na Pluralidade – O ser humano à luz da fé e das reflexões cristãs de A. García Rubio, trago uma das questões do caráter histórico e bíblico do Espírito:

“O caráter histórico e bíblico do Espírito, refere-se à experiência de Deus que se dá através das ocorrências históricas, que tem a historia como ambiente que é percebido no tempo. Esta experiência está situada entre a recordação e a esperança. As recordações e as expectativas de Deus transformam a presença experimentada de Deus numa presença histórica.

O Espírito está presente em momentos característicos do povo de Deus nos dias atuais, como esteve no passado por meio de uma força vital chamada: “ruah yahweh” - Espírito de Deus - interpretada como furacão, uma tempestade, uma força no corpo e na alma, na humanidade e na natureza. Esta força pode ser entendida como o acontecer de Deus que penetra o mais íntimo da existência humana.

Em um segundo momento, pode-se ver a presença do espírito de Deus no meio do seu povo, conduzindo, orientando, julgando, apaziguando e consolando.

Pode-se perceber o espírito de Deus e a sua Shekiná, ou seja, a identidade do caráter do Espírito de Deus, não a sua propriedade, mas a presença do próprio Deus.

O Espírito que participa que se entristece que se alegra que mostra o anseio de Deus pela união com o povo e suspira por seu repouso na nova e perfeita Criação tornando possível por sua inabitação nas criaturas.

Por fim, o Espírito como expectativa messiânica onde a experiência de Deus é vista como Universal, total, permanente e direta.

A eterna presença de Deus, para a qual as experiências históricas de Deus apontam. “Nela as recordações e as experiências do espírito hão de ser cumpridas e deixarão de existir”.

Esta questão teve como base o texto: a “Experiência Histórica do Espírito” extraído do livro: “O Espírito da Vida: Uma Pneumatologia Integral” de Jurgen Multmann.

Vi neste ponto uma síntese da primeira parte do texto de Garcia Ruúbio onde o autor procura mostrar a que, tanto no Antigo Testamento quanto no Novo testamento, há uma coincidente apresentação do homem numa perspectiva fortemente unitária que apontam tanto para aspectos diversos do único ser humano quanto para a realidade da mesma do homem inteiro.


A visão unitária do ser humano na Sagrada Escritura

“O Antigo Testamento pressupõe uma visão fortemente unitária do homem... esta perspectiva unitária encontra fundamento na fé no único Deus criador-salvador... o ser humano concreto, no seu todo, é criatura de Deus. É a fé bíblica no Deus criador que leva a rejeitar e a superar com toda a radicalidade, as visões dualistas que estabelecem uma ruptura dicotômica entre espírito e matéria, entre alma e corpo, e desenvolve uma relação de exclusão entre ambos... não existem dois princípios criadores (o princípio bom, que estaria na origem da realidade espiritual, e princípio mal, origem da realidade material), mas a ação criadora amorosa do Deus que também é salvador”.

“O Novo Testamento reconhece a existência do dualismo no interior de cada ser humano, entre a realidade do ‘homem velho’ e a realidade do ‘homem novo’, mas não se trata de um dualismo metafísico que aponta para dois elementos constitutivos do ser humano (espírito-matéria), antes está referido a dois modos de existência antitéticos, em cada um dos quais está implantado o ser humano inteiro”.

Esta visão unitária do ser humano na Sagrada Escritura é que remota para o texto bíblico citado no início desta explanação. Onde “a tentação idealista que leva a proclamar a dignidade da pessoa humana, sem prestar maior atenção às situações concretas que impedem o crescimento do ser humano como pessoa, penetrou também em ambientes cristãos. Uma antropologia que definia unilateralmente o ser humano como ‘espírito’, considerando o ‘corpo’ como algo exterior à pessoa humana, como um mero instrumento utilizado pela pessoa, possibilitou esta deformação da visão cristã do ser humano. Ora, se o corpo não é constitutivo da pessoa humana, não há porque por que dar muita importância (quando se trata dos outros, naturalmente!) às condições materiais miseráveis em que esta se encontra com tanta freqüência...”

É claro que é desejo de Deus que o Homem seja um só com Ele e, assim, esta unidade se torne abrangente aos que o cercam.

Em Atos dos apóstolos 20:28, Paulo fala aos presbíteros da Igreja de Éfeso:

“Atendei por vós e por todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele comprou com o seu próprio sangue”.

Mas como colocar esta unidade em prática quando todo o sistema, inclusive e infelizmente, o eclesial, leva para um individualismo, uma separação que consiste em cuidar do meu primeiro e se sobrar tempo, vejo o outro?

Vimos que desde o princípio, Deus se mostra um só com o seu povo desde a criação, passando por toda a História deste povo escolhido e culminando em Jesus Cristo, exemplo maior de Unidade com o Pai.

Na Pneumatologia Integral aprendemos que, Deus cria o homem para uma vida criativa e que uma teologia meramente espiritual gera uma vida espiritual religiosa limitada. Não é possível existir uma teologia da espiritualidade que se choque com a Teologia da criação. Um Deus que cria por amor, não pode deixar de amar.

Isto leva ao homem a pensar em um desenvolvimento da sua unidade com Deus e com os outros. O que na é fácil.


Penetração do dualismo antropológico na reflexão teológica cristã.


O Helenismo foi marcado pelo rompimento de fronteiras entre os países e culturas. Quanto à religião houve uma espécie de sincretismo; na ciência, a mistura de diferentes experiências culturais; e a filosofia dos pré-socráticos e de Sócrates, Platão e Aristóteles serviu como fonte de inspiração para diferentes correntes filosóficas das quais o Neoplatonismo exerceu forte influência sobre a teologia cristã. Ele via o mundo com algo dividido entre dois pólos: numa extremidade estava a luz Divina ou Deus. Na outra reinava as trevas absolutas. A seu ver a luz Divina iluminava a alma, ao passo que a matéria eram as trevas.

“Em contraste com a visão helênica de ser humano com sua orientação marcadamente dualista, o cristãos do séc.I, num nível existencial e pré – filosófico, possuíam uma visão unitária de homem, perspectiva herdada do antigo Israel, sobretudo da fé no único Deus criador e salvador, mas enriquecida pela revelação, mediante Jesus Cristo, do que significa ser humano. Que acontece com esta visão de ser humano, quando o universalismo da missão evangelizadora leva a igreja a expressar-se no mundo cultural helênico”?

“A Igreja, embora tivesse de enfrentar não poucos desvios e erros, soube empregar elementos da filosofia grega a serviço da tematização mais rigorosa da fé cristã. A utilização do instrumental grego, contudo, fez com que uma certa infiltração do dualismo penetrasse na visão de homem e de mundo própria dos cristãos”.

“A orientação que procurava salientar os pontos de coincidência entre fé cristã e cultura helênica, especialmente o pensamento filosófico, mantendo uma atitude de abertura e de diálogo e utilizando decididamente o instrumental grego, foi mais influenciada pela antropologia dualista, sobretudo neoplatônica. A outra tendência que ressaltava preferentemente os pontos de divergência e mantinha uma atitude, se não fechada (isto seria incompatível com o dinamismo missionário cristão), bastante reservada em relação ao mundo cultural grego-romano, ficou mais apegada às afirmações bíblicas sobre a unidade básica do ser humano e recebeu uma influência dualista bem menos acentuada que a primeira”.

“As posições antropológicas dos cristãos foram ficando mais bem esclarecidas, em face do grave desafio representado pelo gnosticismo”.

“O movimento gnóstico é bem anterior ao cristianismo e as suas características básicas consistem na preexistência da alma, a sua queda e o correspondente castigo de viver num corpo, o desprezo pela corporeidade, a salvação obtida mediante o conhecimento da origem e do caráter celeste próprio do homem (por causa da sua alma) e mediante o seguimento fiel do caminho indicado pelo ‘revelador”.

“A salvação para o gnóstico só pode constituir na libertação da alma da situação de degradação em que se encontra, condenada que está a viver sujeita à matéria”. “A salvação mediante a encarnação real de Deus e mediante a ressurreição corporal não passa para o gnóstico de um colossal disparate”.

“O gnosticismo penetrou fortemente em ambientes cultos greco-romanos e também em certos círculos cristãos. A sua grande capacidade de adaptação explica por que os cristãos nem sempre perceberam o perigo que ele representava para a fé cristã”.

“A visão cristã de homem introduz no mundo cultural grego um elemento estranho. O cristão deve manter-se sempre fiel a este elemento, mesmo em oposição ao prestigioso pensamento helênico. Outros, pertencentes sobre tudo à Escola de Alexandria, aceitam o dualismo antropológico como meio de expressão, mas migrando-o de tal maneira que a intencionalidade básica cristã fica respeitada. A utilização de um dualismo moderado de orientação neoplatônica é vista como instrumento de luta contra as teses dualistas radicais da gnose”.

Nesta luta, os padres apologistas passam a usar de maneira cada vez mais decidida o instrumental lógico dos gregos. “No horizonte da racionalidade grega, pretendem provar aos apologistas que a verdadeira racionalidade se encontra no cristianismo e refutam, assim, as acusações de que este era objeto”.

“No que se refere à antropologia, os apologistas mantém fidelidade à visão cristã unitária de homem, se bem que o instrumental utilizado acarrete já um início de penetração do dualismo”.
No séc. II destaca-se a figura de Santo Irineu, que vai contra todas as tendências dualistas gnósticas e defende a visão unitária do homem fundamentado na fé no único Deus criador-salvador. Este não se define somente pela alma, sozinha:

“O homem completo é a conjunção ou união da alma que assume o Espírito do Pai reunida à carne que tem sido modelada segundo a imagem de Deus”.

“O homem é imagem de Deus não só na alma, mas também no corpo que recebe, assim, uma valorização positiva”.

“O homem como união da alma e do corpo é imagem de Deus, enquanto que o homem ‘espiritual’ (no sentido Paulino) é fruto do dom de Deus mediante Jesus Cristo. Em ambos trata-se sempre do homem integralmente considerado”.

Em Santo Tomás é que teremos a superação do dualismo impregnado até então.

“Precisamente o que Santo Tomás mostrará é que uma substância não pode ser forma. No homem não existem duas formas, antes a alma é a ‘única forma do corpo’, de tal maneira que a realidade do homem é composta de alma (como forma) e de matéria-prima. Não existe, pois, uma união acidental entre alma e corpo, tal com aparece em todas as correntes dualistas”.

“Corpo e alma são, antes, dois princípios metafísicos dentro de uma unidade primordial do homem, de maneira que toda a atividade do homem é ‘operatio totius hominis”.

Sob o aspecto crítico, a penetração do dualismo na antropologia da Cristandade, faz nos ver que as Escrituras não se importam com a salvação do homem constituído em partes, mas sim, ele como um todo. A antropologia bíblica vê o homem de forma integral, corpo/alma.

“O homem pertence ao mundo material, mas não se reduz à matéria. O homem pertence ao mundo espiritual, mas não se reduz à sua espiritualidade. O homem é espírito e matéria. Mas esta dualidade não deve tornar-se dualismo, isto é, espírito e matéria não devem ser colocados numa tensão de mútua oposição-exclusão”.

Esta deve ser uma das questões de maior atenção a ser dada pelo magistério eclesial.

“O homem inteiro é criado por um Deus bom e o homem inteiro participa da salvação e da glorificação. A salvação cristã não permite a ruptura oposição alma e corpo que os dualistas radicais propugnam”.


Complexidade do ser humano: corpo e alma ou dualidade na unidade da pessoa.

“A pessoa é o ser humano concreto que se autocompreende como uma unidade, como centro de unidade, antes de qualquer cisão dicotômica. Trata-se de uma unidade vivida na dualidade de aspectos e dimensões básicas, pois se é certo que a pessoa autopercebe-se corpórea é igualmente verdade que não se identifica com o seu corpo. A pessoa também autopercebe-se como sujeito irredutível ao próprio corpo. A tradição ocidental designa esta dimensão com o nome de ‘alma espiritual”.

“A pessoa humana é simultaneamente corpórea e espiritual. Mas percebe esta dualidade numa unidade fundamental..., a pessoa experimenta como próprias tanto umas quanto outras, numa profunda unidade entre ambas, de tal maneira que existe uma intima interdependência entre ela com profunda influência mútua. O ser humano autopercebe-se, como anterioridade a toda reflexão filosófica, como um ser vivo único”. Um organismo vivo. Um sistema, uma estrutura, uma forma que subsiste, embora se renove cada um dos elementos que a integram. O organismo vivo permanece o mesmo, apesar das modificações dos seus elementos materiais.

“Existe em todo o ser vivo uma ‘realidade estrutural que não é um elemento material, mas integra uma multiplicidade material, e que permanece imutável durante a vida toda do organismo”.

“Outra característica do ser vivo é o seu admirável sistema de auto-regulação, ou seja, a capacidade de ‘dirigir por ele mesmo os milhares e dezenas de milhares de reações físico-químicas que se efetuam a cada instante do seu desenvolvimento”.

Desta forma chega-se a conclusão de que o homem não pode ser comparado a uma maquina ou considerado como tal.

“A pessoa humana é corpórea e, assim, o corpo humano não deve ser considerado um mero instrumento da alma, como queria o platonismo; também não é pura exterioridade, como afirmava o dualismo cartesiano. A corporeidade é uma dimensão da pessoa humana, do ‘eu’ humano... é a pessoa humana quem experimenta como próprios a dor ou o prazer bem como a outras atividades do corpo. ‘A corporeidade é tão própria do homem quanto a sua espiritualidade. O homem é sempre um espírito com corpo; um espírito sozinho, descorporificado, não pode ser um homem”. “O ser humano não tem corpo (não é um objeto que possa ser possuído), mas é corpo (dimensão básica da pessoa humana)”.

“É pelo corpo que a pessoa humana se expressa, se faz presente e se comunica aos outros seres humanos; é pelo corpo igualmente que a pessoa humana intervém no mundo das coisas transformando-o e criando cultura”.

“No que diz respeito à reflexão antropológica sobre alma e corpo, para além das recentes discussões sobre a conveniência hoje de continuar utilizando esta terminologia, convém notar bem que ela nos situa no coração da complexidade do ser humano e nos alerta, ao mesmo tempo, contra todas as simplificações que acabam sempre empobrecendo a riqueza própria da pessoa humana”.

Quanto à superação do dualismo antropológico na Igreja latino-americana permanece a preocupação citada no começo por parte do magistério eclesial. Uma vigilância, especialmente dos pastores, para que a integridade da mensagem de salvação seja sempre anunciada bem como os “imperativos da verdadeira libertação humana, no quadro desta mensagem integral”.

Conclusão:

Diante desta explanação, chego à conclusão de que o homem é o alvo principal de Deus e objetivo deste, para que o mesmo se chegue a Ele, sem dúvidas ou paralelismos que o impeçam de ver n’Ele, Deus, o Senhor, Salvador e Criador de sua vida espiritual.

Na Pneumatologia integral, a santificação se dá pela busca na Escritura por uma base para construir seus conceitos e fazer Teológico e cabe ao homem buscar superar os diferentes estágios de desenvolvimento tanto na sua vida secular quanto na sua vida espiritual.

Todo o homem enquanto não é alcançado por Cristo, é inimigo do mundo, por não ter a capacidade de amar. A nova vida em Cristo é a radicalidade do compromisso com o outro. Isto é amor.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Liderança com Propósito

"Qual é a sua Paixão"?
Com esta pergunta, Dale Galloway e Warren Bird iniciam o seu livro "Liderança com Propósito", uma lição prática e eficaz para os líderes do nosso século e para àqueles que pretendem ser.
Todo líder tem uma visão, neste contexto tratado pelos autores como "Paixão" e no ambiente eclesiástico a "visão" sempre é tema nas rodas de conversas e conferências.
"A paixão é o combustível para a visão" e assim aprende-se a cultivar, reabastecer e aumentar a paixão.
Requer um encontro com Deus e onde ela foi tocada espiritualmente.
Vem de períodos silenciosos com Deus.
Surge de gastar tempo com os outros que são apaixonados. Destaco este gastar com aproveitar sem preocupação o tempo com os que também tem paixão.´
É preciso tirar uma folga para sonhar com a Paixão.
E quando vem a adversidade, a renúncia às coisas menores deve ser feita para ganhar as coisas menores.
A mudança pode ser dolorosa. Todavia, se eu não propuser a mudança, a situação vai me atrasar e impedir-me de ser tolerante.
Algumas ações podem impedir de ter a paixão que Deus quer para inspirar o coração. Dentre elas:
Amargura, Desobediência, Agitação, Atitudes egocênctricas, Ausência de enfoque, Cansaço físico, Avareza, Relutância em fazer mudanças dolorosas.
Nada é mais poderoso que a sinergia criada quando o povo de Deus, liderado por alguém cheio do Espírito, caminha junto com paixão.
Podemos testar e ver se a Paixão ou a Visão é de Deus:
1. Seria uma coisa importante para Deus?
2. Iria ajudar pessoas feridas?
3. Iria manifestar o melhor que há em mim?
4. É algo que Deus me deu prazer?

Continua...

sábado, 20 de março de 2010

CONHECER A DEUS

Eu é que sei que pensamentos tenho sobre vós; pensamentos de paz e não de mal, para vos dar o fim que desejais. Então me invocareis, passareis a orar a mim e eu vos ouvirei. Buscar-me-eis e me encontrareis quando me buscardes de todo o vosso coração. Serei achado de vós, diz o Senhor, e farei mudar a vossa sorte….” Jeremias 29:11-14a.



Na maioria das vezes, nosso “conhecimento” de Deus é baseado naquilo que aprendemos a seu respeito com outras pessoas ou na nossa própria concepção de Deus.

Vivemos uma época em que todos os pontos de vista são aceitos, e as pessoas se sentem aptas a tirar suas próprias conclusões – quase sempre teóricas – sobre todas as coisas, pois tudo se tornou relativo. Sendo assim, Deus se transforma naquilo que queremos ou entendemos que Ele seja e funciona conforme as nossas conveniências. No entanto, conhecer alguém consiste em muito mais que teorias particulares ou apenas ouvir dizer a seu respeito. Consiste em um contato pessoal. Com Deus não é diferente.

É verdade, somos seres naturalmente egoístas e, em matéria de Deus, quase sempre o procuramos só quando estamos com a corda no pescoço. Nossa concepção de Deus é de que ele seja uma espécie de gênio da lâmpada e sua principal finalidade é a de realizar a lista dos nossos desejos, que é infinitamente maior que apenas três. Então passamos a buscá-lo com toda intensidade a fim de conseguirmos o que queremos. O que nem sempre percebemos é que, antes de nos satisfazer, Deus deseja revelar-se a nós e faz isso através dos nossos dissabores, pois só o buscamos com o coração aberto quando sofremos. Os momentos de dificuldade são uma porta aberta para o nosso encontro com o Deus real, aquele que é imutável, que foi ontem, é hoje e será para sempre. Aquele que não pode evoluir porque é a essência da perfeição, aquele que não se adéqua a nada nem a ninguém, pois é soberano e fiel aos seus próprios princípios que são retos e justos.

Assim, quando questionamos nossas próprias atitudes e abrimos o coração diante de Deus, não só para que Ele nos atenda, mas, especialmente, para que nos mostre a Sua vontade e aja em nosso favor, então conhecemos o Seu amor e interesse por nós. É aí que Ele nos ensina o que quer que aprendamos, a direção que deseja que sigamos, os planos que tem para nós. Como fazer isso? Através da oração e da leitura da Bíblia. Não há outra forma. Quando oramos, falamos com Deus. Quando lemos a Sua Palavra, Ele fala aos nossos corações. E quando fazemos isso com os olhos do Espírito, automaticamente o nosso foco muda, deixando de ser o problema e passando a ser o próprio Deus. Então temos a clareza de como somos ínfimos diante da grandeza deste Deus, “que é poderoso para fazer muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, conforme o Seu poder que opera em nós. A Ele seja a glória…” Efésios 2:20-21a.

Deus tem muito a fazer por nós e através de nós, mas Ele tem seus próprios meios para o realizar. Rendermo-nos à Sua soberania é a coisa mais acertada a fazer, ainda que a Sua reposta aos nossos pedidos frustre as nossas expectativas. Mas, então, Ele nos surpreenderá. Porém, apenas quem busca conhecê-lo de todo o coração é capaz de se submeter a Ele confiadamente e com a fé renovada a cada dia.



Os Hebreus

A Epístola aos Hebreus




INTRODUÇÃO

Apesar de que poucos escritos do Novo Testamento sejam mais impressivos em sua eloqüência, beleza e força de expressão, nenhum livro apresenta maior numero de problemas sem solução do que esta epístola aos Hebreus. Até o seu próprio titulo tem sido criticado, portanto não se trata de uma epístola e, sim, de um excelente trabalho dirigido aos crentes em todas as regiões e, não apenas a algum isolado grupo de hebreus convertidos ao cristianismo. É chamada de epístola, e realmente o é, mas de tipo todo peculiar. De fato, começa como um tratado, prossegue como um sermão e termina como uma epístola. Seu valor se baseia, essencialmente, no quadro ousado que apresenta a respeito de Cristo.
Cristo é o Filho de Deus, superior aos profetas, verdadeira deidade, criador, objeto de exaltação por todo o universo, superior aos anjos. Cristo é o grande Sumo Sacerdote que transcende a todos os sacerdotes. O tema central deste tratado é o sacerdote de Cristo.
Cristo é o Sumo Sacerdote que trouxe à fruição tudo quanto era meramente prefigurado nas formas anteriores de adoração. Essas formas anteriores eram sujeitas a modificações, e, de fato, sofreram mudanças; mas, por detrás delas, há uma realidade imutável, encontrada na pessoa de Cristo – tal como diz a explicação platônica do mundo: por detrás de todas as formas visíveis e temporárias da existência, há um mundo invisível, mas bem real, imutável e perfeito, que age como modelo da criação e que, ao mesmo tempo é o alvo de tudo aquilo na direção do que tudo se esforça, a fim de que suas perfeições e sua eternidade sejam compartilhadas. Na revelação cristã, esse mundo eterno é exposto perante os homens mais claramente do que jamais o foi no passado. Nessa revelação se vê que, na pessoa de Cristo, são exibidas as grandes verdades e realidades religiosas. Esta epístola, pois, consiste essencialmente na revelação da elevada dignidade e do imenso valor de Cristo, e, como tal, assume lugar ao lado do evangelho de João, e das epístolas aos Colossenses e aos Efésios, como as mais claras revelações sobre o Filho de Deus e sobre o que isso significa para os homens, que há entre nós.
Essa elevada revelação do Filho eterno de Deus, tão eloqüentemente retratada, tem mais do que mera motivação dogmática: o autor sagrado interessa-se por certos cristãos que, sob influencia de conceitos religiosos legalistas e pagãos, hesitavam em sua fé, correndo o perigo de abandonar o grande avanço na inquirição espiritual que é apresentada na revelação cristã. Essa é a razão pela qual Cristo é retratado em termos tão vividos e absolutos. Se alguém abandona a Cristo, não haverá mais lugar para onde se possa ir, porquanto a verdade de Deus está centralizada nele. Ele é o alvo final e absoluto de toda a existência. Outras religiões têm tido o seu valor, mas podem ser reputadas apenas cópias e imitações, algumas mais desejadas e outras mais perfeitas, daquilo que Deus finalmente, trouxe aos homens na pessoa de Cristo.


1) O autor

A Epístola não menciona nome e inicia sem qualquer endereçamento. O autor deve estar ligado à tradição da Igreja romana. Já a igreja antiga tentava adivinhar o nome do autor. Desde o século II, a igreja ocidental considerava Paulo o autor da mesma. No entanto, já os sábios alexandrinos Clemente e Orígenes perceberam que o próprio estilo da Epístola depunha contra a autoria de Paulo. Eles desenvolveram a hipótese do secretário. Clemente supunha que Paulo tivesse escrito a epístola em língua hebraica para hebreus e que Lucas tivesse traduzido para o grego.
Orígenes não quis fechar a questão, e opinou: “Só Deus sabe quem é o autor dessa epístola”. E essa opinião persiste até os dias de hoje.

2) Os destinatários

Aparentemente este é mais um mistério da carta, pois tudo o que sabemos para identificar os destinatários é o título que possivelmente deu-se pelo teor da carta. O título ligado a está carta no manuscrito mais antigo que existente é “Aos Hebreus”, e pelo que nos relata Guthrie, não há manuscrito da carta que não tenha esse título. O próprio Guthrie afirma na sua introdução que nos tempos de Clemente de Alexandria e de Tertuliano a epístola era conhecida por esse nome. Algumas hipóteses interessantes com relação aos destinatários originais da carta foram levantadas, baseados no teor da carta, Guthrie, por exemplo, expõe alguns indícios para a identificação dos mesmos:

(...) Certamente o autor sabe algo a cerca da historia e situação. (dos destinatários específicos.). Sabe que foram abusados pela sua fé e que reagiram bem ao despojamento das suas propriedades (10.33, 34). Tem consciência da generosidade dos seus leitores (6.10) e conhece o estado de mente atual deles (5.11ss.; 6.9ss). Certos problemas práticos tais como sua atitude para com seus líderes (13.17) e questões de dinheiro e de casamento (13.4,5) são mencionados. Se este for a verdade o título é claramente enganoso. (O título como endereçado a toda a comunidade hebraica, mas deporia a favor de um grupo mais específico, de conhecimento intimo do autor.) (...) Outra indicação da natureza do grupo pode ser deduzida de referencias tais como 5.12 e 10.25. A primeira é dirigida àqueles que nesta altura já deviam ser mestres, e isto deu origem à sugestão de que os leitores eram uma parte pequena de um grupo maior de cristãos. A sugestão mais favorável é que formavam um grupo numa casa que se separara da igreja principal. A exortação em 10.25 apoiaria esta opinião. Ali, o escritor conclama os leitores a não deixarem de congregar-se juntos. Parece razoavelmente conclusivo que a totalidade de um igreja não teria sido considerada mestres em potencial, e é altamente provável que um grupo separatista pudesse ter se considerado superior aos demais, especialmente se foram dotados com dons maiores. O tema que nesta Epístola é argumentado de modo compacto está de acordo com a sugestão de que um grupo de pessoas com um maior calibre intelectual está em mente. (...)

Laubach, também afirma que a exortação constante em Hb 5.11 – 14 sugira a suposição de que a carta talvez seja dirigida apenas a um determinado grupo de fiéis específicos de uma comunidade, do qual estariam excluídos os irmãos dirigentes, os líderes da comunidade.Porém a opinião mais comum, principalmente entre os comentaristas mais antigos é de que a localização dos destinatários estaria entre os judaico-cristãos da Palestina ou de Roma, ou outras cidades em que houvesse judeus-cristãos de formação helenista, p. ex. , em Éfeso, Tessalônica, Alexandria. Também é levantada a hipótese de que os receptores da carta seriam judeus – cristãos de origem sacerdotal.
Por ultimo podemos citar a hipótese de que os destinatários seriam membros antigos da comunidade dos essênios em Cunrã que se converteram ao cristianismo, este ponto é citado tanto por Guthrie como de passagem por Dattler, mas como esta hipótese não é melhor desenvolvida por nenhum dos autores concluímos que é pouco sustentável.
Constatamos então que assim como a autoria é desconhecida, o destinatário também não é por completo de identificação clara. Apesar das conjecturas não terminarem aqui, Guthrie mesmo levanta a questão da possibilidade dos leitores originais serem gentios, cremos que há uma sustentação um pouco maior por serem judeu-cristãos de uma comunidade específica, porém de localização vaga.

3) Data e local da redação

A exemplo das epistola paulinas, a Epistola aos Hebreus é citada literalmente como documento respeitado, na primeira Epistola de Clemente, datada do ano 96, embora sem referência expressa. Conclui-se, pos, que deve ter sido redigida algum tempo antes do ano 96. Por outro lado, autor e destinatários pertencem à segunda geração (Hb 2,3). Isso sugeriria a data de redação após o ano 70.
Sobre o local da redação A Bíblia de Jerusalém afirma que baseado no Cap. 13, 24, pode-se supor que foi enviada da Itália, e que tenha sido escrita antes da queda de Jerusalém.

4) Canonicidade

Desde os tempos dos Padres Apostólicos foi reconhecida unânimemente a autenticidade paulina com caráter escrito divinamente inspirado (canonicidade) da Epístola aos Hebreus. Por exemplo, S. Clemente Romano, 4º Papa, no l séc., conhece perfeitamente a Epístola aos Hebreus: na sua Epístola aos Coríntios cita-a 12 vezes e sempre como escritura inspirada. O autor da II Epístola aos Coríntios conhece-a profundamente e a cita livremente. Aludem-se a ela a Epistola dita de Barnabé e o Pastor de Hermas.

Em algumas regiões do Ocidente, principalmente na África, por causa dos abusos que desta Epístola alguns hereges (montanistas, novacianos e donatistas), tentando apoiar nela a sua tese de irremissibilidade de certas faltas cometidas depois do batismo, nasceram no meado do ll século hesitações e dúvidas que duraram até à metade do lV séc. Superadas estas preocupações dogmáticas, desde o séc. V foi unânime e constante o ensino da Igreja universal, culminado com a decisão do Concílio Tridentino que na definição do Cânon dos livros inspirados enumera 14 epístolas paulinas, inclusive Ad Hebreos (D. 784). A canonicidade da Epístola aos Hebreus é, portanto, uma verdade de fé.

5) Motivo e propósito

A condição espiritual se reveste dos receptores da epistola tem muito maior significação que sua localização geográfica. O escritor claramente contrasta o estado em que seus leitores se encontram com o estado em que estavam anteriormente, com o em que deveriam estar, e com o estado em que pareciam estar no perigo de cair. Ainda que crentes eram indolentes (Hb 5.11-6.12) e desanimados (Hb 12.3-12). Haviam perdido seu entusiasmo inicial pela fé (Hb 3.6,14; Hb 4.14; Hb 10.23,35). Haviam deixado de crescer, ou melhor, de progredir, e sofriam de séria deficiência no que tange à compreensão e ao discernimento espirituais (Hb 5.12-14). Estavam deixando de freqüentar as reuniões cristãs (Hb 10.25) e de ser ativamente leais a seus líderes cristãos (Hb 13.17). Necessitavam ser novamente exortados a imitar a fé daqueles que os tinham precedido na viagem para a glória (Hb 13.7). Tendiam para ser facilmente levados ao redor por ensinos novos e estranhos (Hb 13.9). Corriam o perigo de não estarem à altura das promessas de Deus (Hb 4.1), desviando-se daquilo que tinham ouvido (Hb 2.1). Estavam mesmo no perigo de abandonar completamente a fé, numa deliberada e persistente apostasia (Hb 3.12; Hb 10.26); e esse perigo tornar-se-ia mais grave se deixassem de freiar qualquer dentre seu número que estivesse se movendo nessa direção (Hb 3.13; Hb 12.15). Caso cederem a tal tentação e vierem a rejeitar realmente o Evangelho de Cristo, não poderão esperar senão o julgamento (Hb 10.26-31).
Particularmente na qualidade de quem anteriormente haviam sido zelosos aderentes do judaísmo, parece muito provável que os leitores originais da epístola tinham ficado pessoalmente desapontados com o Cristianismo porque, por um lado, ele não lhes tinha proporcionado qualquer reino visível terreno e, por outro lado, o Cristianismo havia sido decisivamente rejeitado pela grande maioria dos seus irmãos de raça, os judeus. Além disso, o continuo apego ao Evangelho parecia apenas envolvê-los na participação das repreensões injuriosas de um Messias sofredor e crucificado, e no ter de enfrentar a possibilidade de violenta perseguição anti-cristã. É bem possível, portanto que se sentissem seriamente tentados a renegar a Jesus como o Messias e tornar a abraçar os bens visíveis e preferíveis, que o judaísmo parecia continuar a oferecer-lhes.
Guthrie acrescenta que o cristianismo não poderia oferecer paralelo com relação à pompa ritual que eles haviam conhecido como costume. Ao contrário do Templo, que todos os judeus respeitavam como o centro do culto, os cristãos reuniam-se em lares diferentes sem sequer terem um lugar central para suas reuniões. Não tinham nem altar, nem sacerdotes, nem sacrifícios. O judaísmo dispunha de um reconhecimento não só das autoridades como do povo em geral. Todas estas questões poderiam levar o convertido a querer rever suas posições.
Que era o judaísmo que assim os atraía, em detrimento do Cristianismo, parece confirmado pelo modo óbvio com que o escritor resolve, desde o início da epístola, demonstrar a superioridade do novo pacto sobre o antigo, exibindo particularmente a proeminente excelência de Jesus, o Filho de Deus, em comparação com os profetas e os anjos, os líderes e os sumos sacerdotes que operavam na antiga dispensação. Portanto, o escritor mostra que se a antiga ordem era imperfeita e provisória, o Cristianismo trouxe perfeição (Hb 7.19), e perfeição que é eterna (Hb 5.9; Hb 9.12,15; Hb 13.20). Tanto o autor como seus leitores originais aparentemente eram judeus helenistas que tinham alguma familiaridade com o pensamento filosófico dos gregos, e parece que o autor lança mão de idéias baseadas em tais origens ao declarar que a antiga ordem continha meramente "figura do verdadeiro" (Hb 9.24) ou então apenas a "sombra dos bens vindouros, não a imagem real das cousas" (Hb 10.1). Por outro lado, o Cristianismo é a própria verdade, a celestial e ideal realidade, que possui real e absolutamente todos aqueles valores inerentes que naquela ordem antiga, quando muito, podem apenas serem refletidos ou prefigurados. Não obstante, visto que seus leitores reconheciam a autoridade divina das Escrituras do Antigo Testamento, seu argumento final em favor do reconhecimento da superioridade de Cristo sobre os anjos e sobre o sacerdócio levítico, e a favor da superioridade de Seu sacrifício de Si mesmo-sobre os sacrifícios de touros e bodes, é o testemunho profético do próprio Antigo Testamento. Ver Hb 1.5-13; Hb 7.15-22; Hb 10.5-10.

O propósito do escritor, por conseguinte, era tornar seus leitores plenamente cônscios, primeiramente, da admirável revelação e salvação dada por Deus aos homens, na pessoa de Cristo; em segundo lugar, deixá-los plenamente cônscios do verdadeiro caráter celestial e eterno das bênçãos assim livremente oferecidas e apropriadas pela fé; e em terceiro lugar, para dar-lhes plena consciência do lugar de sofrimento e paciente persistência (mediante a fé) no presente caminho terreno até o alvo do propósito de Deus, conforme demonstrado na experiência e na obra do Capitão de nossa salvação e na disciplina de Deus aplicada a todos os Seus filhos. Em quarto lugar, ainda, para proporcionar-lhes consciência do terrível julgamento que certamente sobrevirá a qualquer que, conhecendo tudo isso, rejeitar tal revelação em Cristo. Tendo-se esforçado para torná-los cônscios de tudo isso, o propósito complementar do escritor é impeli-los a agir de conformidade com esse conhecimento. Tais propósitos são apresentados através da epístola inteira mediante o emprego de exposição racional, exortação desafiadora e solene advertência.
O texto da Carta, conforme vimos anteriormente, tinha a clara intenção de demonstrar que apesar de tudo que o culto judaico poderia oferecer, o cristianismo era de sobremaneira melhor, e caberia aos irmãos caminharem na fé.


6) O método exegético

O autor segue, a princípio, as formas de pensar de seu mundo. Essas formas de pensamento se nos deparam mais estranhas justamente quando o autor deriva e fundamenta explicações exegeticamente. Isso ocorre em 2,6-9, onde é interpretado o Sl 8, e em 3,3ss que é uma exegese de Nm 12,7. E 3,7-4,11 é uma explicação de Sl 95,7-11 nos moldes do midraxe. Especialmente estranha é a exegese da perícope que fala de Melquisedeque (Gn 14,17-20) nos versículos 7,1-10. A exemplo de Filão arranca do nome “Melquisedeque” um significado etimológico misterioso (7,2), e do silencio da Escritura sobre origem, nascimento e morte de Melquisedeque postula-se sua eternidade (7,3). A relação entre a palavra Escrita e da verdade atual é estabelecida, nos exemplos citados, pelos mesmos métodos exegéticos usados no mundo dos judeus e helenista, pelo menos formalmente.
Seu conteúdo, porem, sempre confere um caráter diferente a esse método exegético. Pois no caso a Escritura é relacionada, por princípio, à ação de Deus em Jesus! Se, porém, essa ação de Deus em Jesus é de fato o objetivo do AT, essa exegese adquire relevância apesar das formas de pensamento condicionadas a seu mundo. Examinemos, em primeiro lugar, associações diretas de palavras do AT com Cristo e sua Igreja!
Hebreus não cita o AT com profecias. Por essa razão também não estabelece a relação entre palavra do AT e Cristo conforme o esquema “profecia” – “cumprimento”. Em hebreus, Deus fala a Cristo ou à Igreja diretamente através de palavras veterotestamentárias. Tomemos por exemplo 4,5-7, o trecho-chave para o sacerdócio de Cristo; a palavra do Sl 110,4 é entendida diretamente como palavra de nomeação de Deus a Jesus: “Cristo não se glorificou a si mesmo para se tornar sumo sacerdote, mas aquele que lhe disse: “Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque” (foi quem lhe deu essa honra). Não obstante, essas associações de forma alguma são arbitrárias. Constata-se que o procedimento do autor pode ser resumido em determinadas regras também e justamente por intermédio dos critérios de um enfoque histórico.

  •  6.1 - São aplicadas a Cristo palavras do AT sobre o rei de Israel: Sl 2 em 1,5; Sl 110 em 1,3.13; 5,6; 7,15.17.21; 10,13; 12,2; e ainda Sl 45 em 1,8 e 2 Sm 7,14 em 1.5.

  •  6.2 – As referências dos salmos ao caminho do justo são aplicadas a Jesus, o que certamente constitui uma tradição exegética da igreja primitiva que remonta a Jesus (§ 18, VII, 3): Sl 22 em 2,12; Sl 8 em 2.6ss; Sl 40 em 10,5-15.

  •  Palavras referentes a profecias do AT sobre o Kyrios = Jahvé são associadas a Jesus: 1,6 (=Dt 32,42) e 1,10-12 (=Sl 110).

  • Em analogia, uma palavra dirigida a Israel é aplicada diretamente à Igreja (3.7-11). Ao ordenarmos e verificarmos dessa maneira a exegese pneumática de Hebreus, estamos aplicando um enfoque que a própria epístola desenvolve: a assim chamada interpretação tipológica do AT.

7) A teologia

Embora, ainda hoje, não se tenha a confirmação de quem seja o autor desta carta, é muito importante que nós, como cristãos, nos esforcemos por entender a sua mensagem. Que nos induz a compreender a divindade e sua revelação que inspira nossos corações.
Heinrich Julius Holtzmann, com tendência unilateral e provocadora, vai dizer: “Toda a filosofia da Epístola aos Hebreus se movimenta dentro do esquema alexandrino do antagonismo metafísico de idéia e fenômeno, eterno e finito, celeste e cósmico, protótipo e cópia”. Ele tinha em mente o fato de, segundo a Epístola aos Hebreus, o serviço sumo-sacerdotal em Cristo se realiza num santuário celeste como o dos sumos sacerdotes levitas se realizava num santuário terreno (8.5; 9.1-11.23). Mas será que Epístola aos Hebreus de fato pensa em primeiro lugar nesse dualismo cósmico-helenista vertical, ou estaria pensando na horizontal histórico-salvífica, a exemplo de Jesus e Paulo? Para a cristologia isto significa o seguinte: É Jesus o fenômeno de uma idéia eterna, ou aquele que vem consumar a História? E para a soteriologia: É a salvação do homem o arrebatamento da alma para a pátria superior, ou a participação do êxodo do novo povo de Deus?

A resposta a essa pergunta pelo método básico que serve de ponto de partida a Hebreus, é assinalada por sua compreensão das Escrituras e exploração dela. Em sua exegese, de fato, a vertical aparece duas vezes. Em 12.22 e 13.14 fala da Jerusalém celestial. Filão lembra que, a exemplo do dualismo platônico-gnóstico, sempre justapõe ao mundo de categoria inferior o mundo celeste ideal. Também Hebreus não toma apenas o santuário descrito em Êx. 25.40 por mera figura. Para ele constitui-se em símbolo de uma realidade. Ao dizer: “Pois Cristo não entrou num santuário feito por mãos humanas, figura apenas do verdadeiro, mas no próprio céu, para agora comparecer perante Deus por nós” (9.24). Hebreus qualifica este santuário celestial e o serviço sacerdotal celeste com a terminologia dualista. A exemplo de João, o termo alethinos (verdadeiro) caracteriza o verdadeiro em contraposição ao não verdadeiro, dentro do pensamento dualista. No entanto há que se notar que tanto em João como em Hebreus o verdadeiro não é qualificado de cósmico, mas mediante a relação imediata com Deus. São elementos dualistas da filosofia helenista e gnóstica primitiva que Hebreus recorre, mas que lhe servem apenas de meios para expressar a supremacia escatológica de Cristo. Ao contrário disso, é a horizontal histórico-salvífica a base de seu pensamento teológico que se expressa na exploração tipológica da Escrituras, que é o caso bem mais freqüente.
Qual é a intenção dessa interpretação da Escritura que não tem paralelo comparável em todo o NT nem quanto à intensidade nem quanto à perfeição formal? Muitas vezes se lhe atribuíram intenções apologéticas ou polêmicas: o autor se teria proposto a apresentar uma prova bíblica para sua cristologia a partir do AT que para os leitores constituía uma autoridade, e, ao mesmo tempo, reivindicar polemicamente para os cristãos esse mesmo AT. No entanto, em parte alguma se observam argumentos polêmicos ou apologéticos, tais como em Mateus ou nas desavenças de Paulo com judaístas e judeus.
Constata-se nessa epístola que através de uma exegese tipológica do AT intenciona-se interpretar de forma compromissiva a situação atual da igreja e a aparição de Cristo. No caso, a tipologia não é de forma alguma apenas uma maneira de pensar aplicada secundariamente, com intenção de anexar ao AT uma imagem de Cristo construída através de especulação. A tipologia é, pelo contrário, o método produtivo específico da igreja primitiva para a exegese das Escrituras. Seu conceito de Cristo como sendo o Sumo Sacerdote, a epístola aos Hebreus decerto não o desenvolveu espontaneamente apenas do AT. Ela recorreu à tradição. No entanto, os detalhes desse conceito ela os obteve em grande parte através do estudo próprio das escrituras.

8) Conclusão

Como afirmamos na apresentação, apesar de todos os mistérios que rodeiam a carta aos Hebreus, podemos constatar que o autor independente de quem seja foi inspirado, todo o texto de Hebreus nos mostra e afirma a superioridade de Cristo a qualquer outra forma de buscarmos a Deus. O texto flui e somos arrastados pela coerência do autor aos pés de Jesus, onde pela perspectiva da carta podemos vislumbrar a grandiosidade de Cristo e de seu sacrifício na cruz.
Indubitavelmente a falta de certezas com relação ao autor, destinatários, locais, caem por terra após uma análise mais detalhada, pois fica claro que o autor é o Espírito Santo, os destinatários são todos os cristãos que possam estar abatidos ou desanimados, a época em que foi escrita é todo o momento em que é lida e inflama nosso coração coma a alegria da promessa de estarmos nos braços do Pai.




Bibliografia



  •  O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo – R.N. Champlin – E. Candeia.
  •  Teologia do Novo Testamento – Leonhard Goppelt; tradução de Martin Drehe e Ilson Kayser. 3ª ed. SP: Ed. Teológica, 2003
  • Carta aos Hebreus – Roberto Rohregger.

  • O Cristianismo em sua origem histórica e Divina – Pe. Pedro Cerruti S.J – Universidade Católica – 1963